É muito comum em empresas que participam do mesmo grupo econômico compartilharem despesas e custos, alguns deles, assumidos financeiramente por empresas mais capitalizadas, que se dispõem a atuar como holdings, centralizando e compartilhando atividades operacionais comuns a todas as empresas do grupo, tais como (finanças e contabilidade, recursos humanos, administração, suprimentos, sistema de informação e setor técnico.
Contratos desta natureza são conhecidos internacionalmente como “cost sharing agreement” e têm por objeto o rateio de gastos incorridos por uma entidade do grupo (Sociedade-mãe ou centralizadora) em favor de uma ou mais empresas vinculadas (Sociedades Participantes), que os aproveita no desempenho de suas atividades locais.
Antes de seguirmos com as considerações atinentes ao rateio de custos e despesas entre empresas do mesmo grupo econômico, prescinde que abordemos a definição de grupo econômico, como podemos extrair da Solução de Consulta Nº 547, de 19 de dezembro de 2017, verbis:
“30. De ver-se que os atos referenciados são categóricos em exemplificar a possibilidade de se ratear custos/despesas, no caso entre pessoas que possuam alguma relação em suas titularidades, ou seja, são pessoas jurídicas que guardam entre elas algo comum, que é a condição jurídica de integrantes de um agrupamento de empresas, ou seja, não obstante possuírem personalidade jurídica própria, elas estão sob comando de outra pessoa jurídica que detém o comando entre essas pessoas jurídicas, o que as tornam pessoas jurídicas ligadas ou partes relacionadas (no dizer da Resolução CFC nº 1.297, de 17 de setembro de 2010), já que possuem uma identidade, que é o fato de integrarem um grupo de empresas.”
Apesar de os Contratos de Rateio caracterizarem-se por serem atípicos do ponto de vista legal, que não possuem disciplinamento específico no Código Civil, encontra fundamento no princípio geral da autonomia da vontade, previsto na Constituição Federal.
Os pagamentos de reembolso feitos pelas Sociedades Participantes à Sociedade-mãe, tida como a sociedade do grupo que assumiu o ônus financeiro do custo/despesa, denominada também de sociedade centralizadora, não se configuram propriamente com uma remuneração, mas sim um reembolso de despesa, desde que cumpridas certas formalidades, que foram objeto de recente apreciação e que constam da Solução de Consulta COSIT N.º 149, de 21 de setembro de 2021.
Destacamos os principais critérios que a mencionada Solução de Consulta elenca, a saber:
- as despesas reembolsadas comprovadamente que correspondam a bens e serviços recebidos e efetivamente pagos;
- as despesas objeto de reembolso sejam necessárias, usuais e normais nas atividades das empresas;
- o rateio se realize através de critérios razoáveis e objetivos, previamente ajustados, devidamente formalizados por instrumento firmado entre os intervenientes;
- o critério de rateio esteja de acordo com o efetivo gasto de cada empresa e com o preço global pago pelos bens e serviços, em observância aos princípios técnicos ditados pela Contabilidade;
- a empresa centralizadora da operação de aquisição de bens e serviços aproprie como despesa tão-somente a parcela que lhe cabe de acordo com o critério de rateio aproprie como despesa tão-somente a parcela que lhe cabe de acordo com o critério de rateio;
- a empresa centralizadora da operação de aquisição de bens e serviços, assim como as empresas descentralizadas, mantenham escrituração destacada de todos os atos diretamente relacionados com o rateio das despesas administrativas;
- não haja qualquer margem de lucro no reembolso;
- não configure pagamento por serviços prestados pela empresa centralizadora.
É de bom alvitre destacar que os reembolsos auferidos pela pessoa jurídica centralizadora decorrente do rateio de custos e despesas, desde que cumpridas as formalidades dos itens anteriores na sua integralidade, não são consideradas para fins de apuração do IRPJ com base no lucro presumido.
Por conseguinte, a Solução de Consulta COSIT Nº 149/2021 está parcialmente vinculada à Solução de Divergência COSIT Nº 23, de 23 de setembro de 2013, que estende os efeitos para a não consideração como receita para fins de apuração da CSLL, da COFINS e do PIS.
A premissa basilar de todos os itens destacados alhures é que o reembolso não represente parcela alguma de lucro adicional, mas apenas o ressarcimento de custos correspondente ao sacrifício incorrido da realização de alguma atividade, portanto, exigirá das empresas participantes do rateio de uma contabilidade atualizada e com critério pré-estabelecidos, bem definidos e organizados para fins de prova, em eventual verificação por parte da autoridade tributária.
Embora a lista de exigências para o aceite da autoridade fiscal seja abrangente e, em uma leitura rápida, objetiva, com mais atenção percebemos que alguns itens podem ser geradores de contencioso, senão vejamos o item “c”, que pressupõe a adoção do rateio através de critérios razoáveis e objetivos.
Ora, o conceito de razoabilidade pode ser consentâneo para a empresa, para os diretores que conhecem a estão e estabelecem um critério, a prior, razoável e objetivo. Contudo, a depender da interpretação do auditor fiscal ou até do auditor independente, pode divergir a autuar a empresa por omissão de receita, com impactos inclusive criminais, e a ressalva no caso do parecer da auditoria independente, o que é controverso e a Solução de Consulta COSIT Nº 149/2021 deixa lacunas.
Nessa senda, o Contrato de Rateio deve conter a especificação das sociedades envolvidas, indicar todos os beneficiários das atividades desempenhadas por uma das entidades integrantes do grupo e ser assinado por todos os representantes das partes. Conforme mencionado anteriormente, a atividade objeto do contrato deverá ser secundária ou acessória ao negócio principal das entidades beneficiárias e estar descrita de maneira pormenorizada e específica.
A contabilização dos Contratos de Rateio deve ser feita respeitando o princípio da competência. A Sociedade Centralizadora deve apropriar como despesa tão somente a parcela que lhe cabe de acordo com o critério de rateio estabelecido previamente no contrato firmado entre as partes. Quanto à parcela da despesa a ser ressarcida, esta deve ser contabilizada como direitos de crédito a recuperar no Ativo da Centralizadora.
A contabilidade das entidades envolvidas deve refletir de forma fidedigna as operações realizadas, isto posto, aconselhamos a criação de um grupo especial no plano de contas contábeis, específico tanto para as contas de resultado a serem rateadas, como para as contas do ativo onde ficarão registrado os créditos a recuperar.
Em relação à incidência de IOF sobre as operações de créditos já celebrados anteriormente, mister fazer uma importante distinção relativa à utilização do crédito objeto do concreto. Caso os valores tenham sido utilizados com a finalidade habitual, não haverá a incidência do imposto em questão, conforme orientação da própria Receita Federal do Brasil, por meio por meio da Solução de Consulta COSIT Nº 84/2017.
Portanto, os Contratos de Rateio de Despesas têm por objeto o rateio de gastos incorridos por uma entidade do grupo (Sociedade Centralizadora) em favor de uma ou mais empresas vinculadas (Sociedades Participantes), que os aproveita no desempenho de suas atividades locais.
Podem ser objeto do Contrato de Rateio as despesas compartilhadas entre as empresas do grupo. No entanto, custos e despesas gerados por uma determinada sociedade e que estejam diretamente relacionados à sua Atividade Fim, não se enquadram no típico Contrato de Rateio.
Flávio Augusto Nogueira Menezes