Dentre as formas de financiamento da seguridade social, tem-se as contribuições
incidentes sobre a receita ou o faturamento das empresas (art. 195, I, b, da Constituição
Federal). São as conhecidas contribuições ao PIS (Programa Integração Social) e a Cofins
(Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social).
No chamado regime não cumulativo, a tributação incide sobre o total das receitas
auferidas (ou seja, não apenas sobre as operacionais), havendo a possibilidade de
descontar créditos oriundos das aquisições realizadas em um dado período de apuração.
O objetivo é assegurar a neutralidade tributária, evitando o efeito cascata, de modo
a se tributar apenas o valor agregado do produto comercializado ou do serviço prestado.
Dentre os créditos elencados pela legislação, estão os itens utilizados como
insumo na prestação de serviços ou na fabricação de bens destinados à venda (art. 3o,
inciso II das Leis no 10.637/02 e 10.833/03).
Diante disso, discutiu-se qual seria o alcance do conceito de insumo. A Receita
Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa no 404/04, possuía uma visão
restritiva, exigindo que os referidos bens sofressem alterações (tais como desgaste, dano,
perda de propriedades físicas ou químicas) em função de uma ação diretamente exercida
sobre o produto em elaboração. Em linhas gerais, o enquadramento pressupunha que os
insumos fossem aplicados ou consumidos no processo produtivo ou na prestação do
serviço.
Dada a insurgência dos contribuintes, o STJ foi instado a se manifestar, ocasião
na qual a 1a Seção definiu que “o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios
da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a
importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade
econômica desempenhada pelo contribuinte” (REsp 1.221.170).
Desta feita, a Receita Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa no
1911/19, adequou o seu entendimento, admitindo o creditamento de PIS e de Cofins sobre
os itens considerados essenciais ou relevantes para o processo produtivo ou de prestação
de serviços. Ademais, incluiu aqueles que, mesmo empregados posteriormente, tivessem
a sua utilização decorrente de imposição legal.
Recentemente, os contribuintes obtiveram respostas favoráveis ao creditamento
de PIS e de Cofins, cujas alíquotas totalizam 9,25%. Para exemplificar, cita-se o caso de
uma indústria alimentícia e de uma fabricante de estruturas de concreto, para as quais
foram admitidos créditos sobre os gastos com vale-transporte, por serem decorrentes de
imposição legal, desde que se refiram ao deslocamento de funcionários que atuam no
processo produtivo (Solução de Consulta DISIT/SRRF06 no 6026/21 e no 6027/21).
Destaca-se que, se não fosse a ampliação do conceito de insumo (e o consequente
enquadramento no inciso II, do art. 3o das Leis no 10.637/02 e 10.833/03), o crédito não
poderia ter sido reconhecido, haja vista que a referida legislação (em seu inciso X)
autoriza o creditamento apenas para empresas prestadoras de serviços de limpeza,
conservação e manutenção.
Outro exemplo pode ser visto na recente Solução de Consulta Cosit no 164/21, a
qual dispôs que máscaras de proteção, luvas e álcool em gel fornecidos a trabalhadores
em razão da pandemia da Covid-19 poderão ser considerados insumos, gerando créditos
de PIS e de Cofins.
O entendimento da Receita Federal do Brasil tem sido no sentido de que a
caracterização de insumo restringe-se aos itens utilizados na produção de bens ou na
prestação de serviços, “não alcançando as demais áreas de atividade organizadas pela
pessoa jurídica, como administrativa, contábil, jurídica, comercial, etc.”, o que tem
levado muitos contribuintes a buscar o Poder Judiciário.
Fato é que a discussão está longe de ser dirimida. No âmbito do STF, está-se
aguardando o julgamento do Tema no 756 (RE no 841979).
Nele, analisa-se possível violação ao disposto no art. 195, § 12o, da Constituição
Federal, o qual dispõe que a lei definirá os setores de atividade econômica para os quais
as contribuições incidentes sobre a receita ou o faturamento serão não cumulativas.
Para as recorrentes, a referida não cumulatividade, incluída pela Emenda
Constitucional no 42/03, foi elevada à “categoria de verdadeiro princípio constitucional”,
de modo que caberia ao legislador ordinário “somente a tarefa de definir para que setores
da atividade econômica a não cumulatividade seria aplicável, sem prever, contudo,
restrições à sua eficácia”.
Considerando a maior amplitude da temática (possibilidade ou não de haver
limitações infraconstitucionais ao regime da não cumulatividade), questiona-se qual será
o impacto do julgamento sobre os créditos de PIS e de Cofins reconhecidos em razão da
ampliação do conceito de insumos pelo STJ. Estar-se-á diante de uma reviravolta?
Normativo: Constituição Federal, art. 195, I, b e § 12o. Lei no 10.637/02 e Lei no
10.833/03, arts. 3o, III e X. Receita Federal do Brasil, IN no 404/04 e IN no 1911/19.
Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil, Solução de Consulta
Cosit no 164/21. Superintendência Regional da Receita Federal do Brasil da 6a Região
Fiscal, Solução de Consulta Disit no 6026/21 e no 6027/21. Superior Tribunal de Justiça,
Recurso Especial no 1.221.170. Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário no
841979.
Natália Roese
Advogada Tributarista (Santa Cruz do Sul/RS). Membro Associada ao Instituto Brasileiro
de Direito Tributário (IBDT). Especializanda em Gestão Tributária (USP). Especialista
em Direito Previdenciário (UCS). Bacharela em Administração de Empresas (UFRGS).
Graduanda em Ciências Contábeis (UNISC).