Quando falamos em planejamento sucessório e patrimonial, não falamos somente de bens e proteção patrimonial, mas acima de tudo de uma história viva de muita luta, perseverança e superação que somente o(a) fundador(a) sabe o que teve que passar para construir o seu legado e abrir o seu próprio caminho nesse mundo.
Devemos lembrar que a tributação irá influenciar diretamente o desempenho do legado deixado pelo(a) fundador(a), e define como o(a) patriarca (matriarca) será lembrado(a) e respeitado(a) pelas futuras gerações.
E exatamente por tratar de uma causa tão nobre, é fundamental pontuar os erros mais comuns na constituição de um sistema de holding, inclusive em relação à falta de uma visão futura prévia da tributação imobiliária!
Dessa forma, é essencial um estudo de viabilidade inicial, que seja capaz de mostrar (em números reais e em uma linha do tempo projetada), uma comparação realista de todos os possíveis cenários futuros, e uma simulação dos desdobramentos tributários de cada um deles, destacando os caminhos que levarão ao mais próximo possível da realidade desejada pelo grupo familiar.
E como geralmente todo sistema de holding acaba realizando a integralização imobiliária, mais do que relevante uma abordagem detalhada do tratamento tributário em cada imóvel, até para previsão das despesas tributárias.
Esse estudo de viabilidade tributária deve ser específico e deve abordar questões de ordem prática, como por exemplo: o objetivo maior que é buscado pelo grupo familiar, se é de planejamento sucessório ou de economia tributária, e ainda, qual a finalidade real do imóvel que será integralizado.
No caso de imóvel rural, outro ponto que deve ser estudado previamente é a possibilidade do imóvel integralizado na empresa continuar a ser explorado economicamente pela pessoa física, se há contrato de parceria rural, de arrendamento ou de comodato, e a busca da melhor estrutura societária e tributária para cada família.
Na prática, a importância desse estudo irá indicar – por exemplo – se haverá o acionamento (por engano) da regra que afasta a imunidade imobiliária prevista na parte final do artigo 156, §2º, I da CRFB/88, o que pode prejudicar o(a) fundador(a), bem como seus sucessores.
Se de um lado, sabemos que há um benefício real (imunidade) do ITBI (Imposto de Transmissão de Bens Imóveis) na integralização do capital subscrito, em imóveis, consoante previsto no art. 156, §2º, I, da Constituição Federal, que assim diz:
Não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica – Destacamos!
De outro lado, caso não haja um estudo preventivo e prévio das questões que envolvem essa integralização, não é incomum ocorrer a previsão (equivocada), no ato constitutivo, de uma atividade preponderante de compra e venda de bens ou direitos imobiliários, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.
E no caso desse equívoco, quem pagará a conta será o(a) próprio(a) fundador(a), pois o benefício real da imunidade do ITBI, na integralização do capital subscrito, em imóveis, será totalmente afastado, tal qual está previsto no art. 156, §2º, I, 2º parte, da Constituição Federal, que assim afirma:
… salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil; – Destacamos!
Certo! E qual a fórmula exata para se obter a autorização do Município para gozar da imunidade imobiliária no caso de integralização de um imóvel em um sistema de holding, e como evitar esse erro? Temos duas respostas!
Resposta simples: é necessário se observar, desde o início, se é o caso real (ou não) de um sistema de holding imobiliária, em vez de incrementar essa atividade no ato constitutivo, sem qualquer fundamento plausível.
Já a resposta completa, e mais assertiva, é: cada caso demanda um parecer próprio, até porque por ser um tributo de competência municipal, deverá ser feito um estudo específico da legislação municipal onde se encontra(m) o(s) imóvel (imóveis).
Além disso, é mais do que certo que esse benefício tributário imobiliário deverá respeitar o disposto no artigo 156 da Constituição Federal, bem como o artigos 35 a 42 da Lei Federal 5.172/66 (também conhecido como Código Tributário Nacional).
Somente por meio de uma análise técnica prévia, por meio de um estudo de viabilidade tributária, será possível uma “passagem do bastão” mais confortável para filhos e netos, sem surpresas tributárias desagradáveis, por meio do tratamento adequado à realidade dos fatos, de forma a garantir a continuidade dos negócios de forma saudável.
Não podemos perder de vista que, embora o sistema de holding seja capaz de evitar um longo e dispendioso processo de inventário e conter potenciais conflitos familiares, a profissionalização e uniformidade administrativa do grupo econômico familiar, o planejamento tributário imobiliário adequado é fundamental para a segurança financeira do negócio.
Portanto, nunca se esqueça de realizar o mapeamento técnico criterioso e adequado dos negócios e da realidade do grupo familiar, para a construção de toda a estrutura técnica capaz de entregar, dentro do possível, todo o cenário desejado, com a melhor economia tributária permitida pela legislação.
Somente com uma análise prévia da tributação (inclusive imobiliária), e desde que feito de forma plenamente lícita, o(s) fundador(es) poderão impactar positivamente as gerações futuras, prestigiando a união e a história da família, ao evitar a dilapidação patrimonial comum dos inventários e de outros sistemas de planejamento sucessório.
Referências Bibliográficas:
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